Barão da Mata - Verdades e Diversidades

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domingo, 19 de maio de 2013

MINISTRO DECIDIU QUE MAIORIDADE PENAL NÃO VAI SER REDUZIDA E FIM!


O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, profere, no plenário do conselho Nacional de Justiça, que nem uma emenda constitucional pode alterar a maioridade penal para dezesseis anos.  Convertido a sumo jurista da República, decidiu o que é e o que não é cláusula pétrea..  Aí eu fiquei confuso: afinal quem vai violentar a ordem jurídica é o Legislativo ou o Executivo?  O Brasil, deve ter pensado, não precisa desse negócio de autonomia entre os poderes e definição do papel de cada um deles: o PT é quem manda e ponto final! O mais é coisa de idealista, de gente romântica que acha que o mundo tem de ser assim ou assado.  Aí  eu fiquei pensando: se Sua Exa. decidiu assim, provavelmente a matéria nem será apreciada pelo Congresso: a palavra final tá dada e pronto!
O que ele, porém, não vê é que o crime organizado, por exemplo, vem utilizando há muito tempo a "mão-de-obra" de menores de dezoito, justamente pela ausência de risco de estes mofarem nas penitenciárias, porque, de acordo  com a aberração jurídica estabelecida, um rapaz de dezesseis anos é capaz para decidir quem governa o país, mas não para responder por seus erros.  Isto é um grande incentivo à criminalidade, porque a impunidade fulcrada em lei estimula o indivíduo a cometer mais e mais atos perversos e, o que é pior, mortais.  Acho impressionante o fato de que a sociedade inteira consegue enxergar isto, mas o ministro e o PT, não.  Não é à toa que digo que o PT tem o pior oftalmologista do mundo: deve ser algum companheiro muito afeito a rapapés e muito empenhado em ajudar na perpetuação do partido no governo e completamente esquecido das peculiaridades de seu ofício de fazer enxergar melhor.  
Agora, sem ironias, a verdade é bem outra: eles contam é com os votos dessas pessoas, de suas mães e familiares agradecidos, porque a maioria absoluta dos delinquentes juvenis é de camadas carentes, que também correspondem à parte maior da população brasileira, e é com a maioria dos votos que alguém se elege, seja para administrador ou parlamentar.  Quem pagará por tais erros serão as pessoas de bem e mesmo as de mal que vivem no território nacional: mães continuarão a chorar seus filhos, mais mães ainda  irão chorar filhos mortos, porque a legenda do governo e seus asseclas precisam de votos ao preço de a violência ficar de estável a crescente - ou você acha que esta complacência ante a violência vai surtir outro efeito?
Se é para prestar a minha colaboração a esse estado de coisas que esses políticos acham justo, quero sugerir que instituam logo o bolsa-crime, com o cadastramento dos menores envolvidos com atos ilícitos ou hediondos, para que estes possam gozar o benefício de dois a três salário mínimos mensais como forma de compensar a periculosidade das funções por estes exercidas.  Vai dar voto de enxurrada!

2013

terça-feira, 14 de maio de 2013

DE QUANDO O DEBATE É INÚTIL

Perda de tempo é tentar argumentar com o oponente absoluto, o cínico, o ignorante e aquele que não quer de nenhum modo deixar valer suas ponderações.

domingo, 12 de maio de 2013

VÂNIA E OS DOIS IRMÃOS

Toda santa sexta-feira era aquele diabo!  Euclides nunca vinha para casa.  Vânia ficava esperando, o banho tomado e o corpo perfumado, um vestido curto de tecido leve e quase transparante, como se o marido fosse, surpreendentemente, chegar antes da madrugada, percorrer os olhos pelas suas coxas e pelo vestido a esvoaçar levemente com o vento, apalpar-lhe a cintura, os seios e as nádegas, sentir nas pontas dos dedos a textura do vestido, despi-la, possuí-la num ímpeto febril... Mas tudo isso eram devaneios! O danado sempre voltava na manhã de sábado ou então em profunda madrugada.  E naquele dia não seria diferente: passaria a noite na esbórnia, chegaria bêbado, cheirando a cigarro e perfume barato, com todos os indícios de haver passado a noite com alguma vagabunda.
Vez por outra vinha com hematomas, sinal de haver-se metido em alguma briga, mas nunca dava satisfações ou se explicava.  Mesmo que viesse com marcas de batom!
-- Sai pra lá! Vai dormir! Tava com mulher porra nenhuma! -- limitava-se Euclides a rugir quando ela notava alguma pista mais clara de o marido havê-la traído. Outras vezes ela reclamava quando o pegava sóbrio:
-- Você só quer saber de beber e chegar de madrugada.  Esquece que tem mulher.  Você acha que isso é casamento?
Ele se limitava a ficar murmurando entre os dentes alguma coisa que  mal se entendia, mas nunca se dispunha a discutir a questão.  
Era aquele sofrimento toda sexta-feira.  Mas Vânia não sofria só nos finais de semanas: era praxe ele ficar pelos botequins quase diariamente, muito embora não madrugasse nos outros dias, chegando sempre entre dez e onze da noite.
Não faltava, ou pelo menos não faltava tanto com os deveres de marido.  Buscava-a na cama, fazia amor, mas com um carinho e uma frequência menores do que ela desejava.  Vânia não sabia se ele ainda a amava, nem mesmo se ela própria continuava a nutrir amor pelo marido.  Mas sentia uma necessidade quase orgânica de ser acarinhada, de ter os dedos de alguém por entre os  cabelos, de ter a boca demorada e intensamente beijada... como nas novelas que via... como nos romances de bolso que lia... como fora no seu tempo de menina, de recém-casada.
Estavam ambos casados já havia cinco anos, não tiveram nenhum filho por ser a mulher infértil, e às vezes esta presumia ter sido por isso sua a culpa do desgaste daquele casamento -- muito embora Euclides jamais houvesse reclamado do fato.  Mas a questão é que Vânia tinha a sensação de haver-lhe feito um homem a sentir-se incompleto, frustrado, que a punisse  com a ausência e a desatenção o fato de não ser pai.
Era difícil o Euclides: quase não falava, quase não sorria.  Era pedreiro e vivia aporrinhado e resmungando sobre os ossos do seu ofício.  Vivia cansado ou então enfiado nas suas bebedeiras.
- Merda de vida...! - costumava queixar-se com sua voz quase gutural - Muito trabalho e o dinheiro pouco.  Só trabalho e aborrecimento... Isso lá é vida!?  
Aos sábados e domingos aquela sensação de solidão seguia a apertar o peito de Vânia: ele acordava tarde e pouco falava, ora comido pela ressaca, ora enclausurado em seus pensamentos e seu mau-humor, os olhos voltados para a televisão.  Diabos! Três anos de namoro e cinco de casamento, e Vânia pouco conhecia o seu homem.
A casa era triste e silenciosa, monótona, tediosa, e só ganhou alguma vida quando Eusébio, o irmão mais velho de Euclides, chegou de Aracaju e instalou-se num quarto-com-banheiro que Euclides construíra no fundo do quintal para abrigar o outro.
Eusébio era falante embora parecesse tristonho. Às vezes mergulhava em profundo silêncio, mas não era como o irmão.  Era mais comedido; não se encharcava de bebida, era sociável.  Euclides recebeu-o com enorme alegria, entregou-lhe o quartinho que lhe levantara com grande satisfação.
-- Vê só, mano: com o tempo você aumenta esse teu quartinho, pega um pedaço maior do terreno e me paga aos pouquinhos: o importante é nós ajudar um ao outro.
Depois da chegada de Eusébio, Euclides tornou-se mais caseiro, raramente madrugando às sextas, chegando quase sempre cedo nos outros dias, e Vânia percebia que isso se dava porque o irmão estimulara-o a ficar em casa a trocar ideias, e também pelo motivo de, como era bastante notório, o marido temer ser traído pela esposa com o cunhado.
Logo Eusébio empregou-se, numa obra cujo encarregado Euclides apresentou-o.  O irmão desempenhava suas tarefas com habilidade, também era um pedreiro de grande competência.
Alguns dias Eusébio chegava do trabalho, banhava-se e comia da comida que Vânia preparava, ficava a conversar longamente com o casal, a tocar em vários assuntos, a rememorar os tempos da infância de extrema pobreza vivida  em Nossa Senhora do Socorro, e a ida da família para Aracaju.  Recordavam  os pais já falecidos e comentavam da impossibilidade de permanecer na terra natal por conta da inexistência de perspectiva de condicões razoáveis de subsistência, da posterior necessidade de deixar a própria Aracaju por razões semelhantes, e Eusébio tinha também uma dor atravessada no peito:
-- Não sei por que a Cássia me deixou. -- lamentava-se -- Eu não fiz nada de mal com ela.  Uma ingrata! Tu não sabe, mano, como eu gostava daquela mulher.
Cássia era a mulher com quem vivera durante dez anos, que nos últimos tempos de vida conjugal não lhe dera mais importância, não lhe fizera mais elogios nem agrados, pouco aceitou-o no leito e tinha-o na conta de quase um traste, além de, num fatídico dia, olhá-lo com um olhar de profundo desprezo e dizer-lhe:
-- Não quero mais viver com tu.  Eu não gosto mais de você.  Vou viver minha vida longe de você.  
O homem lamuriava-se quando trazia à tona aquelas lembranças, e Vânia sentia que identificava-se de certo modo com ele, pois  era uma mulher com o mesmo sentimento de abandono que acometia o cunhado.  Estava casada, vivendo com o marido, deitando com o marido, mas era uma mulher abandonada como qualquer outra sem homem.
Quando encontrava-se sozinho com a cunhada, Eusébio nunca entrava na casa desta, por respeito ao irmão e para não causar impressão ruim a qualquer vizinho que casualmente por ali passasse e o visse entrar, e também porque sabia que Eusébio não gostaria.  Mas ficava sentado a uma cadeira, no quintal, e naqueles momentos sentia-se mais à vontade para falar com maior detalhamento sobre a saudade do norte e principalmentte da tristeza de ter perdido Cássia.
Já se haviam passado dois anos e ele não a esquecia. Tinha  a autoestima ferida, um sentimento  de extrema  solidão, a sensação de uma coisa que doía fundo dentro do peito.
A partir de um certo tempo, Vânia também encorajou-se a relatar tudo aquilo que  corroía-lhe a alma e a fazia infeliz, a queixar-se do marido, que tornara-a uma mulher ávida de afeto e frustrada, triste e solitária.  À medida em que os dois sentiam-se mais à vontade para trocar confidências, Euclides tornava-se mais frequente na esbórnia das sextas e nas pequenas bebedeiras dos outros dias, agora já sem dar muita atenção ao irmão, voltando pouco a pouco a ser o mesmo caladão de antes.
Se, quando o irmão era recém-chegado, o marido de Vânia, enciumado e temeroso, procurava-a na cama com mais frequência, agora voltava a ser o mesmo de antes, voltado para as suas bebedeiras, seus maus-humores e seus pensamentos.  Enquanto mulher e cunhado conversavam quase todas as noites, ela à porta da sala, ele sentado na cadeira do quintal. Até que um belo dia Eusébio entrou.
Vânia colocara um daqueles vestidos leves e curtos com que sempre esperava o marido, e o cunhado  começara a pensar que ela o fazia para ele. Eusébio.  Contivera o desejo mais que pudera,  mas o problema era que aquele equívoco devolvia-lhe tudo aquilo que a ex-mulher  lhe roubara: a autoestima, o desejo de viver,  a sensação de ser um homem à altura da palavra.
Durante a conversa, parou de repente e tomou um pulso de Vânia.  A expressão da mulher era de estupefação, mas ela não relutou, não o repeliu, apenas ficou a encará-lo, os olhos arregalados, incapaz de dizer palavra .  Eusébio foi conduzindo-a para dentro de casa, ela deixou-se levar como um autômato, e os dois se amaram com a entrega e a volúpia dos amantes dos mais picantes romances de amor.
Os dois se deram como que loucamante enamorados, e trocaram tantas carícias e tantas juras de amor, que mais pareciam dois adolescentes embevecidos no primeiro ato sexual de suas vidas.  E desfrutaram plenamente  cada momento,  cada gemido,  cada suspiro,  cada palavra quente, naquela noite de delírios,  em que ambos sentiram-se apaixonados e correspondidos, felizes como se fosse impossível existir na face do planeta qualquer sentimento ou  coisa diversa da luxúria, da paixão e da felicidade.
Tão logo deixaram o quarto e vinham saindo,  ainda ajeitando as roupas e sentindo-se leves como flutuassem, Euclides surgiu na sala, bem diante dos dois.
Ficou longos momentos sem palavra, os olhos febris de ódio, a voz entalada na garganta,  a boca aberta numa estupefação inefável, porque, apesar das suspeitas de que aquilo já estivesse acontecendo antes, tivera durante o período de desconfiança a esperança de estar equivocado.
-- Desgraçados! Filhos da puta! Vagabunda! Puta suja! Maldito asqueroso! - gritou e rugiu ao mesmo tempo, e sentia um furor demoníaco.
Teve um ímpeto de pegar o facão na cozinha e acabar com os dois, que permaneciam imóveis e sem ação.  Mas conteve-se, ofegante:
-- Some os dois daqui...  Pega tudo o que é de vocês e some da minha frente agora.
Eusébio quis dizer alguma coisa...
-- Cala, desgraçado! -- berrou novamente Euclides -- Senão eu te mato! -- Foi saindo, ofegante: - Some os dois daqui agora.  Vou até o botequim.  Se eu encontrar um de vocês aqui quando eu voltar, eu mato.
A rua encheu-se de gente.  Euclides passou carrancudo pelo meio das pessoas, enquanto os amantes estavam quedados e pálidos de vergonha diante dos vizinhos.
Arrumaram as roupas, fretaram uma kombi e saíram do bairro.  Dentro do veículo Eusébio ainda murmurou para ela:
-- Não sei dizer o que tô sentindo.
 Vânia comentou com um ar  de desânimo o olhar distante:
-- Eu vou sumir.  Vou pra casa da minha mãe, que é bem longe. Quero esquecer o dia de hoje.  Tô me sentindo uma piranha! Uma vagabunda!
-- Meu Deus! -- Eusébio levou as mãos à cabeça, não sabia o que mais dizer.
Passado pouco mais de um ano, ele,  Eusébio, numa tarde de domingo, procurou o irmão.  Euclides, que a princípio relutou  em dirigir-lhe a palavra,  por fim acabou por fazê-lo.
-- Só não entra, seu traidor.  Eu falo contigo aqui do portão mesmo.
-- Meu irmão, eu não queria te fazer de besta...
-- Não me chama de irmão, seu maldito...!
-- Desculpa, Euclides, mas não foi por maldade...
-- Você veio me esculachar, filho da puta!? - rugiu com o olhar fuzilante.
-- Não, por favor, não é isso.  Eu só queria te dizer que foi uma doideira... Mas é que eu tava morrendo de tristeza, tinha uma dor que me maltratava...
-- Desgraçado!  Você me traiu com aquela... -- longa pausa -- Ela era a coisa que eu mais amei  nessa vida...
-- Perdoa, Eucli...
-- Nunca!
Eusébio botou a mão no peito:
-- É que eu sentia uma tristeza tão grande, uma coisa que me matava aos poucos, que me doía fundo aqui dentro...
Euclides bateu o portão, deu as costas ao irmão, percorreu o quintal, entrou na casa batendo também a porta da sala. Eusébio murmurou para si mesmo:
-- Uma coisa que mata aos poucos... que dói fundo aqui no peito...
 

2008


PREDESTINAÇÃO


Robert tinha a consciência de que era um predestinado.  Sobretudo porque era talentoso, e já na infância dera evidentes sinais de seu potencial, com sua inclinação e facilidade para lidar com os números e as ciências, sobretudo as biológicas.  Na adolescência, recebera inúmeros elogios dos seus professores de Biologia, o que alimentara os desejos dos pais e do próprio de que este abraçasse a Medicina.
Filho de família classe média com bom padrão financeiro, ao terminar o curso secundário, ingressou na faculdade para a carreira desejada, alcançando um dos primeiros lugares no vestibular.  Isto o fez ainda mais cônscio de que tinha brilho, e deu-lhe a certeza, também alimentada pelos pais, de que o talento nunca vem sozinho: traz sempre a reboque uma missão, uma predestinação, no caso dele a de salvar vidas, tornar-se renomado, envolver-se em pesquisas, descobrir curas, ajudar a humanidade tão carente de auxílio por conta de sua precariedade e ignorância.
-É um desígnio de Deus, uma missão divina. - diziam-lhe sempre os pais, adeptos do espiritismo de Allan Kardec - Todo mundo tem uma incumbência na Terra, ninguém nasce com talento à toa.  Deus é perfeito e nada é por acaso.  Por isto, não neglicencie nunca quanto à elevada tarefa que Ele te deu.
Tal consciência arraigou-se na mente de Robert, que tinha este nome pomposo apesar de brasileiro filho e neto de brasileiros, e este levou os estudos a sério, formulando inclusive planos de ajudar o próximo com alguns atendimentos gratuitos, sem deixar, é claro, de obter os frutos financeiros dercorrentes da profissão.  Ficava a imaginar seu consultório suntuoso,  a construção e crescimento de sua reputação, secretárias bonitas, a reverência dos clientes e a gratidão daqueles a quem atenderia gratuita e caritativamente.  Um futuro grandioso, definitivamente, o esperava.
Na universidade, mostrava-se um aluno do quilate das raras inteligências, na vida pessoal, era benquisto por todos e só tinha algum problema com o seu excessivo magnestismo, pois com frequência era forçado a dar verdadeiros dribles em uma ou outra namorada, já que, com eu já disse, o seu execessivo carisma não lhe permitia envolver-se com uma única moça. 
Quando o universitário já contava vinte e três anos e já se aproximava o tempo de concluir a faculdade, quando este ainda tinha ainda alguma dúvida sobre a especialização a fazer, foi encontrar uma das belas com quem mantinha relacionamento.
Era uma tarde bonita, meio de semana, e Robert postou-se no lugar onde o encontro fora marcado.  Acontece que um carro que vinha em alta velocidade perdeu a direção, subiu a calçada e atropelou Robert, que teve morte instantânea e nos deixou sem saber responder o que fora feito de sua predestinação, dos desígnios de Deus, de sua missão atrelada ao talento, da tarefa de curar e salvar vidas, de auxiliar humanos sofredores, e do futuro magnífico e elevado que sempre o aguardara.

2008