Barão da Mata - Verdades e Diversidades

Barão da Mata - Verdades e Diversidades
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domingo, 26 de dezembro de 2010

O HOMEM FELIZ

"A manhã de ontem foi muito difícil. Passei mais de duas horas tentando amarrar os cadarços dos tênis para ir à rua. Mas o importante é que consegui. Mas fiquei cansado. Porque antes tentara (já que ainda anteriormente me haviam falado que era possível) por longo tempo fazer o meu canário falar. Disseram: 'Vai, insiste, que é possível, sim!' Mas, como você vê, quem me disse estava enganado. Fazer o quê?
Mas segui a vida e fui a um bar para beber com os amigos. Após lá chegar e conversar um bocado, comprei de um vendedor ambulante uma caixinha de morangos, a qual resolvi dar como agrado à minha mulher. Ia deixar o bar para levar-lhe os morangos, mas o Rafa, um rapagão atlético que passa os dias na academia, disse, num gesto de extrema cordialidade, que eu não me cansasse nem interrompesse a conversa, que ia tão agradável, e se dispôs a entregar a ela o presente. Aceitei depois de muito agradecer-lhe, pois o Rafa é um jovem muito obsequioso e que a minha querida esposa admira a ponto de mostrar um brilho sem igual nos olhos quando lhe menciona o nome. São muito amigos os dois. É uma amizade muito bonita. Como é belo o ser humano! Ainda, abusando da boa-vontade do rapaz, pedi-lhe que a avisasse de que não me esperasse para o almoço, pois só chegaria à noite, porque decidira passar o dia inteiro com os amigos. Uma pena o jovem atleta não haver voltado até a hora em que saí do botequim, pois eu teria o maior prazer em pagar-lhe a bebida (se ele bebesse) e o tira-gosto que ele melhor apreciasse.
Chegando a casa, sem querer acordei a minha querida consorte, que estava enrolada entre os lençóis da cama toda revirada e me contava que fora acometida de uma indisposição enorme. Fiquei desconfiado de que pudesse estar anêmica. Resolvi que marcaria um médico para ela.
Beijei-a na testa e disse que continuasse dormindo, sem deixar de me desculpar por havê-la incomodado.
Sentindo-me sozinho, resolvi ligar para minha mãe. A empregada atendeu ao telefone e me disse que minha muito amada genitora fora atender a um cliente no domicílio daquele.
Minha mãe faz um trabalho interessante. Vai toda noite a uma boate e, além de dançar e mostrar o seu corpo ainda lindo apesar dos cinquenta anos, ainda sai de lá com alguns homens inquietos e necessitando de gastar energia. Quando voltam, o homem sempre vem relaxado, feliz e tranquilo. Muito competente minha mãe em seu trabalho de alegrar e desestressar homens tensos. Nasceu com vocação para a medicina.
Liguei então a televisão e fiquei a ver um grupo de políticos a discutir leis e os rumos da nação. Sinceramente, tenho um grande orgulho dos nossos políticos, homens que trabalham dentro da maior competência e seriedade, e que não têm outro intento além de dar o melhor ao país e à sociedade. Vê-los assim a debater as coisas de interesse público me traz uma comoção tão grande, que sempre vou às lágrimas. Tenho-lhes em tão alta conta, que, naquela noite, sem poder ter tido a atenção de minha amada esposa ou de minha querida mãe, não achei a a noite perdida exatamente por vê-los e ouvi-los."
Moral da história: para acreditar em polítcos, só sendo muito burro, corno e filho da ...
2010

domingo, 19 de dezembro de 2010

O MANUAL DO PENSAMENTO PADRONIZADO

Ando cansado de ouvir que sou mal-humorado, rabugento, brigado com a vida, essas coisas do gênero. Não posso dizer que eu seja um campeão de bom-humor, mas as pessoas se equivocam quando fazem as observações de que falo. Porque o que a elas parece azedume de humor é na verdade o meu senso crítico. É preciso que elas separem o joio do trigo: alguém que analisa algo racionalmente, sem envolvimentos emocionais, e tem uma visão crítica e analítica das coisas não pode levar as pechas que tenho levado.
Quando ouço uma emissora de rádio e alguém elogia algum artista ou música que não é do meu agrado, exponho minha opinião e tento justificá-la, sem me limitar àqueles "não gosto não" sem fundamentação. E assim me comporto quando tenho uma avaliação negativa sobre telenovela, filme, programa de tevê, poema, política e político, personagens da história e vai por aí adiante. O meu grande problema é com as unanimidades ou tudo aquilo de que a maioria gosta porque a mídia decidiu que é bom. Acho que elas, já tão acostumadas a se orientar pela imprensa antes de ter uma opinião ou postura sobre alguma coisa, deveriam comprar, nas bancas de jornais, um manual do pensamento padronizado pelos veículos de comunicação. Pronto! Aí ficaria tudo certo. Embora o tal manual ainda não exista, quero sugerir que as editoras o criem e o publiquem mensalmente, determinando quais as boas músicas e os bons trabalhos artísticos, os bons políticos, os bons filmes, etc...etc... Se a coisa der certo, o cara nem precisará ir comprar o manual: poderá baixá-lo pela internet. Já imaginou?
Fico me sentindo um marciano por não gostar de "reality-show", de programa de auditório, de telenovela (vi algumas boas, como Roque Santeiro, no passado, mas hoje não dá), de filme de porrada e tiroteio, de história de amor mela-cueca, de dramalhão, de comédia-garotão-sem-cérebro, de overdose de futebol, de enredos e roteiros baratos e de pouco conteúdo.
Fico impressionado com o fato de as pessoas serem estereotipadas não só na indumentária e nos hábitos, mas principalmente no pensamento. Parecem um monte de robôs de uma mesma série, todos saídos de uma única matriz. Não querem se dar ao trabalho de pensar, examinar as coisas, refletir sobre se as avaliações que lhes mandam prontas são palatáveis ou não. Vão logo engolindo! Parecem avestruzes! Aliás, que as aves me perdoem usar o nome de sua espécie num sentido pejorativo. Mas as pessoas não querem conceber idéias, compram-nas prontas e o assunto tá resolvido.
Agora, se você não quer enfrentar o tipo de problema que enfrento, vou-lhe dar agora algumas orientações - ou "dicas", que é como se gosta muito atualmente de falar. Vamos lá.
Primeiro, não questione a coisa religiosa: se tá escrito na Bíblia é porque é verdade - não fique aí pensando. Aprenda a gostar de "BBB", "A Fazenda" e outras bostas do mesmo tipo, e ainda ache que aqueles caras são todos grandes artistas, de talento inegável e indubitável, porque o grande artista, digno da expressão, fica durante três meses dentro de uma casa, coçando o saco e "trepando" debaixo de edredons enquanto se envolve em inúmeras fofoquinhas baratas e disse-me-disses. Se tem um filho em idade escolar, aconselhe-o a não estudar e fazer de tudo para ser um famoso "big brother". Goste de música titiquinha, essas de trechos curtinhos sempre muito repetitivos, de preferência com duplo sentido e bastante sacanagem no meio. É o ideal. Há uma porrada de pagodes e "funks" por aí com este perfil. Goste de novela: é tudo na vida. Um cara que não se interessa por draminha barato é um inculto, um ignorante. Ame os passeios à região dos lagos e sobretudo os engarrafamentos da Rio-Niterói. E de preferência ligue o som do seu carro bem alto quando estiver no congestionamento, porque barulho nos tímpanos dos outros é, como se diz, tudo de bom. Quando for votar, escolha os políticos mais conhecidos e os mais benquistos pela mídia. Afinal, você está aí para votar, não para pensar. Comova-se com todos os discursos baratos e demagógicos desses caras e, se possível, chore com eles se for o caso; se não for o caso, chore por eles: lágrimas dão um toque de sentimentalismo vagabundo todo especial ao discurso político. Procure sempre ir a restaurantes aos domingos à tarde, principalmente nos dias festivos. Uma boa fila e um restaurante lotado são o que há de melhor para você provar que é igualzinho aos outros. Puxe o saco de qualquer um que tenha dinheiro ou poder. As pessoas acham o puxassaquismo muito positivo e ficam orgulhosas de si quando um sujeito de grana, poderoso ou famoso as cumprimentam com um breve e quase desdenhoso gesto de sobrancelhas. Frequente festas de ruas e ajuntamentos, por mais que eles sejam incômodos, perigosos ou violentos: afinal de contas, você não é um chato.
Eu poderia dar-lhe outras tantas sugestões, mas eu prefiro que você tome estas poucas como ponto de partida, enquanto trabalhamos para a mídia criar o manual do pensamento padronizado. É isso aí, gente! Todo mundo sempre pensando igual!

2010

domingo, 12 de dezembro de 2010

O PENSAMENTO POLÍTICO E OS MODISMOS

Sou do tempo em que tecnocrata era uma expressão de cunho pejorativo. E não podia deixar de ser, se levarmos em conta que, como registra o dicionário "Aurélio", tecnocrata é "partidário da tecnocracia" ou "político, administrador ou funcionário que procura soluções técnicas e/ou racionais, desprezando os aspectos humanos e sociais do problema". Todo tecnocrata, nos anos oitenta e início dos noventa, era malquisto, ironizado, tachado de burro, chcoteado, ridicularizado e tido como perverso, insensível e despreparado para o exercício do poder - justamente por sua negligência e inconsciência quanto às questões sociais.
A partir da era Collor, curta mas nefasta para as classes trabalhadoras, já se passa a ver os tecnocratas e conservadores com olhos mais complacentes, e há uma cruel transformação de mentalidade, porque o nosso "herói" achava que as leis do mercado estavam acima do bem e do mal, e sapecava neoliberalismo pra cima do Brasil, e a mídia, adesista como sempre, é claro que comprou a idéia e enfiou por nossa goela a baixo, e a classe média, no seu impecável papel de avestruz e papagaio, engoliu tudo aquilo com um prazer impressionante, repetindo pelos quatro cantos do Brasil que aquele negócio de liberalismo econômico sem freios e sem preocupação com o social era bom por demais e vai por aí adiante. Embora o protagonista de tal período tenha visto o seu governo morrer prematuramente, deixou como legado um pensamento neoliberal pavoroso. Os segmentos políticos reacionários ganharam corpo, pois havia um clamor muito grande do poder econômico por idéias que defendessem seus interesses. Assim, a doutrina econômica professada pelo ex-presidente ficou, no tempo de Itamar Franco, seu sucessor, pairando no ar enquanto não encontrou campo para encorpar-se e engolir a nação. Itamar, por não ser homem de tendência neoliberal, sempre foi muito pressionado por parte das forças políticas de direita e da mídia para que adotasse a quaquer preço uma conduta de privatizações (ocasionando lucros ou prejuízos ao Brasil), de indiferença aos salários e empregos, de desrespeito às coisas de caráter humano. Em outras palavras, a era Collor inaugura no país uma mentalidade de que as estatais significavam o gigantismo patológico do Estado, que era preciso proivatizar(1), privatizar(!) e privatizar(!), e os salários precisavam ser contidos para o bem das empresas e dos cofres públicos, ou seja, aos salários era preciso achatar(!), achatar(!) e achatar(!), e ainda aos trablhadores demitir(!), demitir(!) e demitir(!). Fernando Henrique é o continuador da maldita obra do xará, e consegue colocar em prática tudo o que o homônimo preparara para o país. Rasgou livros e idéias próprias, também a Constituição, abriu mão da credibilidade pessoal e, por conta disto, em contradição a tudo o que defendera durante quase toda a carreira política, fez um governo de reacionarismo cruel e canibalesco, o que agradou muito aos seus anjos da guarda, que eram os banqueiros e governos estrangeiros. Não deu a menor importância aos anseios e carências das camadas sociais da classes média a baixa, e a sua postura administrativa estava em pura consonância com o pensamento adotado (e na época tornado moda) pelas forças políticas e pela mídia, que sempre faz a prostituta investida do papel de porta-voz do poder econômico e do comando estabelecido.
A vinda do governo Lula deu vida a um fenômeno que, na falta de melhor expressão, podemos chamar flexibilização (terminologia que a desacreditada classe política gosta muito de usar para defender pontos de vista que não merecem crédito) dessa coisa de o remédio ser sempre cair para a direita e deixar danar-se o mundo. Começou-se a propalar, no governo e na imprensa, que essa história de privatização não é bem assim, porque é preciso critério e em muitos casos preservação do patrimônio público. E não é que, arrogante e antipático mas não bobo, o nosso "amado" José Serra, em sua campanha sem sucesso à presidência , acusou o PT de ser privatista, quase dizendo-se estatista e ardoroso defensor do bem nacional? Incrível, não?!
É bem verdade que a inclinação à esquerda que havia nos anos oitenta está sepultada. O PT sempre vendeu uma imagem de partido de esquerda, mas no poder deixou a gente ver que a coisa não é bem assim. Na verdade tem uma conduta conservadora, pois os banqueiros, benficiários de sua política econômica, o abençoam com justa profunda gratidão, e os trabalhadores, tripudiados e iludidos por bolsas disso e daquilo, têm o salário aviltado e não conseguem avançar um milímetro na sua condição material e na própria auto-estima. Os dois governos Lula foram na verdade um arremedo mal feito do governo Vargas, que também era assistencialista e conservador, mas permitiu à classe trabalhadora direitos trabalhistas importantes e ganhos salariais com melhor poder de compra do que os de hoje, enquanto o PT mantém os ganhos dos empregados em baixos níveis e ainda compactua com essa gente que quer suprimir as conquistas obtidas pelos trabalhadores na era Vargas, tornado-se assim (o PT) um governo e uma agremiação pré-getuliana, como pré-getulianos são os políticos de hoje, porque todos são pré-getulianos de tão perversos e retrógrados.
A aceitação ( e defesa), por parte das forças políticas atuais e das pessoas que formam opinião, à famigerada reforma trabalhista é uma prova incontestável de que as idéias neoliberais encontram prefeita acolhida dentro da opinião pública dos dias de hoje, porque o modismo desta vez aponta na direção de uma doutrina antagônica à predominante nos anos oitenta. E o pior de tudo é que uma grande parte do público aceitou o pensamento sem muito raciocinar, mas unicamente para seguir a favor da corrente e acompanhar o que é bonitinho dizer hoje, arrotando asneiras por aí afora enquanto pensa estar falando bonito e dizendo as coisas mais inteligentes do planeta.
Pode até alguém refutar o meu discurso, argumentando que o pensamento não pode ser pétreo, mas, que fique bem claro, quando se trata de questão social, não dá para se mudar radicalmente a opinião, porque pode fazer a diferença entre pessoas terem ou não emprego e algo para comer. E agora, cá para nós, pra quem quer sempre estar do lado que esteja ganhando, até o adesismo requer reflexão, não a aceitação pura e simples por conta do rumo dos ventos.

2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

OS DEMÔNIOS

Alguns religiosos têm uma profunda e extrema preocupação em relação à figura do demônio. Que o demônio deve ser combatido, que o demônio deve ser evitado, que devemos ficar bem longe do demônio: " Sai pra lá, demônio!" Entretanto - e disto eles não se apercebem - independentemente da existência ou não de um demônio rei supremo das trevas, ou ainda de inúmeros minidemônios pelo além afora, é impossível nos distanciarmos dos demônios, porque eles são de carne e osso, com sangue circulando nas veias e coração palpitante. Isto mesmo! Os grandes demônios, os mais perniciosos demônios, estão no dia-a-dia e bem perto de nós.
Eles estão atrás dos volantes dos seus carros (compreendem uma parte significativa dos que dirigem nesta nossa terra sem lei), fazendo direção perigosa e colocando em risco a vida de inúmeros inocentes, entre os quais estão as crianças, os idosos, os animais, os não-idosos (que também têm o direito à vida e à integridade física). Pouco lhes importa se podem causar a morte de alguém e trazer a desgraça a um lar e a uma família, porque não há para estes demônios nenhuma vida que tenha a menor importância. São tão negligentes, que vão às raias da burrice, porque há momentos em que, em manobras absurdamente irresponsáveis, colocam, por conta de ganho de frações de segundo, em risco a vida de si próprios, e tamanha imbecilidade os faz mais demoníacos ainda, porque são, além de perversos, mentalmente involuídos, fazendo-se assim pessoas rasteiras e abomináveis.
Os facínoras, os bandidos de todos os tipos (sejam eles marginais ou oficiais), demônios armados e prontos a produzir morte a qualquer momento, por maldade e habitualidade, são um grupo análogo aos bandidos do trânsito, praticam crimes hediondos e barbáries inefáveis, tendo como instrumento um outro tipo de arma letal: a arma de fogo.
Outros demônios perigosos são alguns entre aqueles que detêm qualquer tipo de poder, porque, com a prerrogativa da punição, da geração de desemprego e de miséria, seja por medida política ou administrativa, parecem ter o prazer nefasto de devastar vidas familiais e comunidades e sociedades inteiras. Alguns provocam guerras e massacres, holocaustos e imensuráveis destruições.
Levando em conta que um automóvel é um instrumento de ferro, que dá a um ser humano um poder físico muito além das suas condições naturais, da mesma forma como uma arma de fogo proporciona o mesmo tipo de aumento de força física, assim como a colocação em boa posição hierárquica dá condições para a prática de atos de peso, o que também representa força, eu repito o que todos dizem : que o poder não corrompe, revela.
Entretanto, não é a conclusão a que eu quero que você chegue. Todo o meu discurso se resume a uma pergunta: dito tudo o que eu disse, me responda: quantos demônios tem o mundo?
2010

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

O PUXASSAQUISMO PODE SER UMA PANDEMIA

Quando ingressei na escola, aos sete anos (naquele tempo não havia maternal, jardim, etc...), já cheguei bem ciente de quem mandava e de que devia obedecer. Era a professora, investida de um poder de fogo respeitável e outras coisas do gênero. Sabia como me portar, procurava manter uma conduta que não me criasse problemas, porque já aprendera a obediência em virtude da disciplina que me fora ensinada pelos meus pais.
Se sabia como me conduzir e conhecia o perigo que representaria indispor-me com a autoridade, por outro lado, no entanto, não procurava uma aproximação pessoal com os professores que tive ao longo dos primeiros anos escolares. Era bem-comportado e cumpria as minhas obrigações, quieto no meu canto, sem praticar trangressões significativas e evitando ser focalizado e observado pelo mestre, por discrição e timidez, mas também por querer manter uma certa distância de quem me dava ordens, evitando uma relação pessoal que eu sempre imaginei seria numa condição de desigualdade. Observava porém detidamente aqueles colegas que faziam de tudo para se aproximar dos professores: tinham sempre o que perguntar ou contar na saída das aulas, ofereciam préstimos, davam presentes baratos e caçavam sempre um pretexto de estarem por perto de quem mandava.
Cresci sem digerir bem esse negócio de uma pessoa mandar na outra, e hoje, funcionário público (sempre precisei comer) e em muitas oportunidades obrigado a reportar-me diretamente a autoridades, mantenho a mesmíssima conduta do início dos meus tempos de estudos. Fico por isto indignado com a figura do puxa-saco : gente que não pode ver sequer um terno numa vitrine, que vai logo chamando o traje de doutor e oferecendo um cafezinho ou uma água gelada. "Doutor fulano, o senhor está mais magro, ficou bem assim. " "Doutora, esse modelo ficou lindo no seu corpinho de cento e sessenta quilos." "Olha, gente, o presente de amigo oculto do doutor cicrano tem que ser bem mais caro, tá?" "Gente, tô tão triste! Doutora beltrana vai se aposentar." Este tipo de coisa sempre me indignou profundamente, sobretudo porque aprendi durante a vida inteira - e isto foi uma lição de pai e mãe - que uma autoridade não é maior do que nenhum outro ser humano, uma investidura em alta posição hierárquica não faz ninguém grandioso, a própria grandiosidade é uma coisa muito relativa e de certo modo bastante questionável.
O que acontece, todavia, é que algumas pessoas aprendem a "arte" da bajulação na infância, praticam-na com maestria na idade adulta e procuram sempre se manter perto de poderosos, quer gratuitamente ou para obter sempre benesses dos seus adulados, ou ainda para tentar (e às vezes conseguir) ser um deles. São em geral gente de pouca lealdade, caráter e personalidade frágil, voltada unicamente para os interesses da instituição (privada ou pública) a que servem, sem nenhuma sensibilidade em relação às questões humanas.
Fico tentando entender essa gente, e me pergunto sempre: será que sou idiota de berço? Sou um debilóide mal ajustado às coisas elevadas da vida? Ou seria essa gente absolutamente vil, abjeta, prostituída e desprezível? Na falta de respostas, a conduta de adulação, essa coisa de verem os poderosos como verdadeiros deuses vivos, sempre tratei isto tudo com muita ironia, muita irreverência, muito escárnio e muita raiva, e minha postura já me causou inúmeros problemas, obrigando-me em algum episódio, em atitude de completa incoerência e contradição (confesso para ser verdadeiro), a buscar no poder proteção contra as maldades dele próprio - é uma situação muito constrangedora e que faz você se sentir um imundo verme. Mas que podia fazer? Não foi pra me projetar, foi pra sobreviver e não ser vítima de sacrifício por conta de perseguição e injustiça.
Enquanto me senti sujo por haver pedido favor ao poder, há pessoas que o fazem com a maior cara deslavada, com a paz de espírito de quem desfia rosários em reza por toda a humanidade. Sinto desprezo e pouca simpatia por essas criaturas, e é claro que elas são freqüente objeto de minhas maldosas piadas. Trato até as pessoas que têm poder de mando com reverência e cordialidade, mas sem embutir nisto nada que as faça sentir maiores do que as outras. Mas os puxa-sacos são demais! Na verdade estou me lixando para se alguém é isso, aquilo e aquilo outro, não faço mesmo concessões a ninguém! Se o cara for então alguém sem nenhuma relação com o meu trabalho, ignoro-o então como se não existisse, além de sentir menosprezo por quem porventura se esmere em agradá-lo.
Mas fico tentando entender os aduladores de carteirinha. Às vezes tenho até boa-vontade: em várias oportunidades, diante de belas mulheres de alto cargo público, tive vontade de examiná-las para saber se eram feitas de alguma matéria diferente da nossa. Só não satisfiz a curiosidade porque certamente seria punido por correr o risco de não ser compreendido em meu alto intento de pesquisa científico-filosófica. Quanto aos bajuladores, preocupo-me sempre com eles: acho que poderia minimizar o problema de adulação inserindo-os em práticas esportivas: por exemplo, tiro ao puxa-saco, malhação ao puxa-saco, lançamento de puxa-saco à distância.
Conheço sujeitos que já andam com um tapete vermelho embaixo do braço, prontos para estendê-lo em caso de darem de cara com algum detentor de poder. Conheci um outro que me fez levantar a tese de que o puxassaquismo seja hereditário: ele andava sempre com uma escova de roupa na mão, para remover eventuais caspas de ternos de eventuais manda-chuvas, e era filho de um voluntário ajeitador de insígnias, que era filho de um voluntário ajeitador de medalhas militares, que era filho de um voluntário ajeitador de togas, que era filho de um voluntário lustrador de cetros, cujo pai emprestava a mulher aos nobres. Uma vez um bajulador muito católico e muito devotado me disse que adular seria uma prática extremamente válida: "... se até no Reino dos Céus alguns querubins agradam ao Senhor de todas as maneiras, esperançosos de um dia serem promovidos a serafins. E veja bem: se Adão e Eva tivessem um pouquinho de puxassaquismo, não teriam desobedecido e comido do fruto proibido para serem expulsos do Paraíso."
O grande problema do puxassaquismo é que ele às vezes me parece um mal pandêmico, e o pior é que os puxa-sacos de grande envergadura acham que deveriam servir, em matéria de relações humanas, de referência às outas pessoas. Durma-se com um barulhos desses!
2010

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

DO FATO DE SER CONTRÁRIO

A minha postura com relação ao sistema torpe que grassa no Brasil é bem simples: sou contra tudo, contra todos, contra tudo o que é a favor e, por uma questão de desconfiança, contra tudo o que é contra.

DA DETESTABILIDADE MINHA E DAS COISAS

Sou uma pessoa detestável, porque detesto tudo, detesto detestar tudo e detesto quando não detesto algo. Porque tudo é detestável: detestável o que é detestável, assim como é detestável o que não é detestável, exatamente pelo fato de não sê-lo. Em outras palavras, o bom-mocismo dos benquistos é algo de uma babaquice e hipocrisia repugnantes.

domingo, 11 de julho de 2010

O VOTO NULO

Coisa interessante, não, essa da mídia e dos políticos, de nos períodos eleitorais fazerem campanha contra o voto nulo? Toda vez em que se observa uma tendência muito grande de uma fatia signitiva do eleitorado votar em branco, artistas e pessoas benquistas pelo público aparecem na tevê e conclamam as pessoas a que votem, não deixem de exercer o seu direito de participar e tataratatá e tererê-pão-duro... Conversa fiada! Votar nulo também é um modo de a gente se manifestar, não é(?), ou será que eu tô ficando mais maluco do que já sou? Se você não tem inclinação por nenhum dos candidatos, se não acredita em nenhum deles (o que é muito fácil, pois político é em geral pouco ou nada merecedor de cedibilidade), porque então haveria de optar por alguém? Não é curioso? Escolher entre o que nos vai rasgar e o que nos vai decapitar. Muito engraçado, não?
Ora, votar nulo por ignorância ou negligência é absolutamente reprovável, mas tomar tal decisão a partir do conhecimento do quadro político e dos homens que se apresentam candidatos é um exercício de democracia saudável e extremamente válido. Não podemos cair nessa conversa de que o voto branco ou nulo é um prejuízo ao regime democrático. Na verdade, os grandes prejudicados com este tipo de voto são os políticos, que ficam numa situação embaraçosa, vergonhosa, sem saber como se portar diante da sociedade por ter um mandato pouco respaldado. O próprio sistema se sente (e fica) fragilizado quando não arrimado por uma votação maciça.
Aí você me perguntaria: "e isto não geraria uma crise institucional?" Aí eu responderia: com crise insitucional ou sem crise institucional, qual é a verdadeira e genuína participação de nós, cidadãos, nas decisões e nos rumos da nação? Qual foi o peso de sua opinião no período do regime militar, fruto de uma crise institucional, nos seus vinte anos de vigência? Quem sabe uma votação minguada não nos traria outros políticos ou disciplinaria os que já temos, pois aí estaríamos realmente participando? Além do mais, oportunistas, dentro de uma situação incomum, só se apossariam do poder se nós os respaldássemos, quer nos omitindo ou adotando postura de defesa e aceitação, pois a ditadura militar só ficou em cena vinte anos porque contava com os dois tipos de apoio da sociedade, não é mesmo? Quando me politizei, aos vinte e poucos anos, quantos e quantos discursos pró-governo eu ouvi, discursos vindos não de uma minoria, mas de um percentual expressivo de pessoas com quem tive o desprazer de debater política naquele tempo. Então? Todo regime só se sustenta - e não sou obviamente o primeiro a dizê-lo - com o aval da sociedade - decorrente do apoio ou da omissão.
Em suma, voto nulo não é vício nem baderna, é uma forma de manifestação legítima do eleitor tanto quanto o sufrágio de qualquer nome.
2010

sábado, 1 de maio de 2010

PERMITA-ME SER PRETENSIOSO E DAR UNS PITACOS SOBRE ECONOMIA

Logo após escrever "Sonho é Presságio?", onde tiro sarro com a cara do Serra, porque não tem mesmo ele outro discurso que o de que " é preciso cortar gastos, que gastos é preciso cortar, cortar gastos é preciso, viver não é preciso". .. Essa porcaria desse discursinho fácil e barato tá no manual de qualquer politiquinho desses que você vê por aí, atazanando tua vida (deixa eu misturar as pessoas do verbo, deixa?) e teu juízo, dizendo nas entrelinhas que não se pode investir em educação, saúde, infraestrutura, segurança, habitação, etc, etc... Você vai ver só a campanha! Ele vai falar o tempo todo ( e é só o que sabe) em conter gastos públicos, discurso do conservadorismo perverso que foi encampado pelo Collor e posto em prática nos recessivos e miseráveis anos FH, onde Serra era figura proeminente. Mas não é exatamente no Serra que eu quero atirar. E sim numa conjuntura.
Bem, vamos por partes. O fato é que, logo após eu haver escrito o texto, minha amiga Virgínia mandou-me via orkut a seguinte mensagem: "Querido amigo Demóstenes (...)Agora me diga como são o seus sonhos com a Dilma. Nós estamos num mato sem cachorro. Se fica, o bicho come, se correr, o bicho pega. Ohooo loco!"
Acho que ela está coberta de razão. Não há pra onde correr. Apesar de eu ser honesto o bastante ( e não adiantaria tentar deixar de ser, visto que tudo está tão claro) para dizer que vou votar em qualquer coisa que estiver em condições de competir com o Serra, mesmo que seja o tinhoso; mesmo assim, agora o que me cabe é voltar ao "x" da questão: a conjuntura de que falo vai levar-me a um discurso muito pretensioso , já que não sou economista, não entendo de economia, não circulo nas suas esferas e coisa e tal, mas o fato é que, quando um político se candidata, tem já um discursinho pronto, tirado de um livrinho manual de Dom João Charuto, de que é preciso conter gastos, investir no social, acabar com as desigualdades e o ponto a que agora quero me apegar: desonerar a produção. Isto mesmo: desonerar a produção. Já ouvi seiscentas e cinqüenta milhões de debates vazios na mesma direção. Coisa cansativa! Dizem tudo, menos a verdade.
Se desonerar tem por objetivo gerar mais empregos e colocar a indústria nacional em condições de competir no mercado internacional, o preço do produto precisa ser barateado, e é aí exatamente onde está o grande nó da história. Todo mundo sabe os altos encargos que um patrão paga ao governo para manter um empregado. Sabe também que estes altos encargos são um fator importante de inibição da geração de empregos. Ou seja, um governo realmente bem-intencionado empreenderia uma verdadeira renúncia fiscal em prol do emprego. Como o governo não quer perder arrecadação, adota uma fórmula simples, mágica e cruel para desonerar a produção: desprotege a classe trabalhadora em não adotar nenhuma política salarial que proteja os salários, permitindo sórdida e covardemente a livre negociação onde a procura por trabalho é sobejamente maior do que a oferta, o que faz as remunerações salariais ainda mais parcas, e dá à indústria as condições de competir lá fora à custa da miséria dos empregados. Em outras palavras: quando se fala em desonerar a produção, parece que se fala em prol dos trabalhadores, mas não é isto: eles falam em prol dos industriais, dos empresários, dos patrões.
Convenhamos que o desemprego é algo muito grave, mas também que uma atividade mal remunerada é um paliativo de pouca eficácia. Portanto, quem quer desonerar a produção muda a legislação tributária e promove renúncia fiscal. Aí me perguntariam:"Se houver renúncia fiscal, como o governo irá compensá-la?" Eu respondo: Ué? Sobretaxa as grandes fortunas! Sobretaxa, supertaxa, megataxa, taxa mesmo as grandes fortunas! Lembro-me perfeitamente de que, quando era ministro da fazenda do Sarney, o Bresser ficou desempregado porque tentou botar no Congresso um projeto de taxação das grandes fortunas, e desde lá o país não viu macho que se dispusesse a fazer um discurso neste sentido. Taxar os ricos distribuiria renda, permitiria o investimento em produção e salários (porque bom salário não é palavrão, não: os políticos e empresários ficam vendendo idéia em contrário para gerar conformismo e manter o "status quo").
Falar em taxar grandes fortunas é subir no cadafalso, é entregar-se à forca, e o nosso "querido" Bresser bem o aprendeu, porque mais tarde se integrou ao governo FH e, na falta de projetos dele próprio e do governo, deu-se a perseguir o funcionalismo público , eleito bode expiatório em todos os episódios em que as coisas vão mal ou simplesmente não se tem projeto político e social de qualquer natureza - e a perseguição de que falo dá uma puta popularidade!
Não há quem tenha a macheza, a honestidade de dizer que é preciso aumentar a carga tributária da abastança. Não seria a solução de todos os problemas, mas permitiria ao governo abrir mão de arrecadação sobre o emprego sem aviltar e comprimir os salários. Porém, todos têm medo de levantar tal bandeira, porque sabem que seria suicídio.
Mas a questão não pára aí: quem quer realmente atuar na área social, precisa necessária, obrigatória, indispensável, imprescindivelmente mexer com as grandes fortunas, porque a questão é clara: sem distribuição de renda não há avanço social. E isto independe de o cara ser de esquerda ou sei lá o que. Distribuir renda é essencial, nada melhora sem isto: a concentração de riquezas absurdas em mãos de poucos é muito gritante, e isto precisa ser disciplinado. Não sou mais de esquerda, não tenho credo político, não milito em coisa nenhuma, mas a distribuição de renda, pelo maior número de meios por onde seja efetivada, é sim a solução de todos os problemas, e é por isto que eu repito: se não há político verdadeiramente disposto a emprender uma verdadeira distribuição de renda, eleição vai continuar sendo um joguinho entre os poderosos e representantes do poder econômico, que ficam se revezando nos postos de poder público. Daí eu repetir: não há pra onde correr. Não adianta falar em nomes, porque a diferença entre uns e outros candidatos estará sempre e unicamente no nome, pois, ganhe quem ganhar esta ou qualquer eleição, este vai rezar pela cartilha imposta pelos economicamente poderosos.
Falei muita besteira?
2010

sábado, 24 de abril de 2010

SONHO É PRESSÁGIO?

Seria o sonho realmente um presságio? Sei lá...Fico hoje reticente em relação à questão.... Isto porque tenho tido um pesadelo freqüente e insistente nas últimas semanas. Sonho que a minha trisavó por parte de mãe, que morreu uns sessenta anos antes de eu nascer, tem uma testa imensa além de uma lisa e vasta careca, e me pega pelos braços enquanto canta: "Serra-serra-serrador, quantas verbas já serrou!" O pior é que, em vez de me projetar para trás e para a frente, só me empurra para trás, e continua: "Da saúde, das escolas, segurança. Serra-serra-serrador, quantas verbas já serrou! Vai serrar ainda mais, vai virar o teu terror."
Fico nos sonhos a olhar para ela apavorado, e a velha, ao final da canção tem um semblante carrancudo, uma postura antipática e arrogante, e me diz com uma voz grave e um ar de dona da verdade: "Serra que se escreve com fh. "
Acordo sem entender absolutamente nada.
Você conseguiria interpretar este meu sonho esquisito?
2010

ELEIÇÕES E AMIZADE ROMPIDA

Estou profundamente indignado com um meu amigo - aliás, amigo não, ex-amigo! - que veio me dizer uma verdadeira infâmia. Veja que o sujeitinho teve o descaramento de dizer que, se povo soubesse votar, não teriam os judeus preferido Barrabás a Jesus quando foram instados pelo Sinédrio a escolher quem deveria ser poupado da crucificação. Tentei explicar-lhe que, naquela ocasião, se o povo assim agiu, foi, pelo que já me elucidaram, porque Barrabás era líder dos zelotas, grupo revoltoso que pretendia libertar a Judéia do jugo romano. Mas não adiantou: o homenzinho foi intransigente. Atirou-me na cara umas duzentas mancadas eleitorais do povo em eleições majoritárias nos últimos vinte anos, além de listas com mais de quatrocentos nomes de cada uma das dez últimas legislaturas do Congresso que não poderiam jamais ter sido sufragados. Sujeitinho inconveniente, obstinadamente disposto a querer negar a irrefutável sabedoria do povo. Agora, me diga uma coisa: não fiz bem em deixar de ser amigo dele?
2010

OS FRUTOS DO DESCONHECIMENTO

Ah! Essa eu não podia deixar passar! Eu tava aqui, ao computador, tentando criar alguma coisa ou pensar num tema pra abordar, quando ironicamente um mastodonte, desses que dão dez berros e uma porrada nos ombros dos outros a cada dez palavras que fala, veio ironicamente em meu socorro, quando lá da rua soltou num grito de "porra, esse time é demais" mais parecido com o grunhido de um pobre porco na hora do abate (pobre porque amo e respeito todos os animais, e às vezes divago sobre como seria bom se eles não fossem abatidos). Este tipo de espetáculo é muito corriqueiro no bairro onde moro , assim como em muitos outros bairros por este Rio a fora.
Se fossem só os berros, até que ainda iria. Mas o grande problema é que esses caras ainda soltam fogos, ateiam fogo no asfalto e cometem outras barbaridades: são verdadeiros terroristas sem causa. Odeio gente sem educação e torcedores extremados: eles são hostis, insolentes e perigosos. Já disse mais de uma vez que são os sectários de maior periculosidade, sobretudo se você levar em conta que no Brasil, ao menos com base nas notícias que nos chegam, não se mata nos últimos anos em nome da política ou da religião, duas das três searas onde se abrigam os mais inflamados radicais: a terceira é justamente o futebol (e de maior número de exacerbados).
Mas a questão é que não são exatamente eles o alvo deste meu comentário. O meu tema são aqueles que se valem deste tipo de situação. Nos anos setenta dizia-se muito que o futebol era um bom intrumento de desvio de atenção dos problemas nacionais para uma direção indevida e equivocada: ou seja, o cara só pensava em futebol e nem sequer tinha idéia dos problemas que verdadeiramente afetavam a sua vida e o seu dia-a-dia. Nos anos oitenta começou-se a negar que o interesse demasiado por um ou mais esportes fosse alientante. Nos anos noventa ficou "provado" que uma coisa não afetava a outra. Na minha opinião pessoal, foi um aforismo que alguém, meio bêbado e meio querendo contestar por contestar, jogou no ar e pegou, colou, cristalizou-se perfeitamente.
Podem me chamar de retrógrado, de arcaico, de reacionário, de cego, mas eu de-fi-ni-ti-va-men-te não a-cre-di-to. O interesse desmedido por futebol aliena, sim! Esses torcedores de que falei, e que correspondem a um percentual significativo, não querem saber de nada, nada mesmo! Só de seus clubes, e fim! Comentam futebol de domingo a domingo, almoçam, jantam e respiram futebol. Torcer por um time é saudável, eu próprio, como tantas outras pessoas, torço por um time. Mas não vivo a me desesperar ou a soltar fogos por ele, não gosto quando perde, mas não fico a me deprimir e a querer explodir o mundo por força da revolta e do desgosto. O caso deles (os fanáticos) é patológico, é uma coisa inconcebível. E o mais grave de tudo é que eles votam, e o fazem, em geral, sem nenhum conhecimento de causa, porque é impossível que alguém dedicado ao futebol vinte e quatro horas por dia possa estar inteirado sobre outro assunto. E aí quem gosta, se regala, deita e rola são aqueles caras que usam colarinho duro, gravata italiana e que decidem se a gente neste ou naquele dia vai ter alguma coisa pra comer ou se virar roendo pedra. Aqueles, sabe? Pois é!
É mentira minha? É? Se você acha, me responda uma coisa: quantos aumentos de preços e medidas antipáticas são tomadas pelos governos em períodos de copa do mundo ou de final de campeonato? Se você não se lembra, a indústria químico-famacêutica produz uma série de remédios pra memória. Procure seu médico.
Estaríamos bem se só os torcedores extemosos tivessem a atenção desviada. Mas a história é muito mais séria. Tem gente que compra um jornal e só lê a página criminal. O crime é realmente, na atualidade, algo muito incidente e um problema da maior relevância, mas uma fonte noticiosa digna do nome não vive exclusivamente da criminalidade. Ou seja, apesar do seu vício de manipulação de fatos, muitas das instituições de imprensa de maior peso ainda dão uma boa gama de informações sobre vários assuntos . O grande problema é que as entidades menos sérias (ou os setores menos sérios das entidades mais sérias) aplicam nas veias do público verdadeiras overdoses de informações irrelevantes e desnecessárias. É o que explica o grande sucesso dos chamados reality shows e outros programecos do mesmo quilate.
Se houvesse uma postura séria por parte dos legisladores e governantes, este tipo de coisa teria uma certa limitação, um certo controle e policiamento; mas ninguém está interessado em que o povo esteja bem-informado das coisas de cunho político e social. Logo eles, os grandes beneficiários deste contexo, porque disciplinariam tais abusos? Quanto menos se saiba, melhor para eles. Até porque, se ao povo fosse dado saber a verdadeira face da realidade, muitos governantes que se transformaram em verdadeiros vultos históricos não teriam, pelos seus desmandos, completado o segundo ano de seus mandatos.
Uma pena. Todo esse processo é, queiramos ou não reconhecer, um grande fator atravancador de progresso e desenvolvimento. Mas o que se há de fazer? O Brasil vai lendo fofoca sobre artistas, assistindo a programas baratos de auditório e tocando a vida por aí afora, crente crente que é feliz.

sábado, 17 de abril de 2010

AS AVENTURAS DE JONAS, O SALAFRÁRIO -- EPISÓDIO DE HOJE: "O SEXO DOS ANJOS



Quando o deputado Sandro Lessa, que defendera o debate sobre o sexo dos anjos, deixou o plenário, foi logo cercado por Jonas Pereira Jojoba, que se fazia acompanhar de Armando Lontra, conhecidíssimo lobista.
- Pô, Lessa, gostei da tua ideia!
- Mesmo? Obrigado. - e tentou sair andando, mas foi parado pelos dois.
- Ô Lessa, peraí, cara! Tu não percebeu a magnitude da coisa?
Lessa parou a pensar por momentos, respondeu:
- Ué? Você não sabia que essa discussão é só pra desviar pra ela própria a atenção da opinião pública, enquanto a gente discute o fim de um monte de direitos dos trabalhadores...? Foi isso que nos encomendaram: fazer um alarde sem tamanho em torno de um assunto sem importância e votar na surdina temas que vão prejudicar as classes trabalhadoras.
- Sei disso - ratificou Jonas - Sei e tô dentro da jogada, meu filho. Não é à toa que a mídia vai dar amplo apoio e divulgação à questão do sexo dos anjos, porque é preciso desviar os olhares da classe trabalhadora.
- E não podia deixar de dar - continuou Sandro Lessa - se eles, donos de jornais e de tevês empregam um monte de gente e vão também se beneficiar...
- Sem contar os incentivos fiscais - entrou o lobista Armando - verbas para custeio de projetos próprios, porque o governo e os políticos desta Casa, na maioria patrões, sabem ser gratos a quem os apoia, principalmente sabendo que vão precisar sempre desses mesmos que hoje lhes dão sustentação... Mas não é essa a questão.
- É! Apoiou Jonas - Não é essa a questão.
- Então - indagou Lessa, já meio impaciente - qual é questão?
Jonas gesticulou:
- Pô, Lessa, tu não sacou?!
- Pô, Excelência, tu não sacou? - apoiou Armando.
- Não. - respondeu Lessa.
- É o seguinte - começou a explicar Jonas: - Esse negócio de sexo dos anjos, com ampla cobertura da mídia e coisa e tal, vai permitir que a gente evite alguns temas realmente polêmicos, como também destrua direitos sociais sem ninguém perceber, além de ter um ponto muito mais interessante..
- Mais interessante?
- É, Lessa! Di-nhei-ro pú-bli-co pa-ra a pes-qui-sa do se-xo dos an-jos, en-ten-deu?!!!
- Ah! - atinou Sandro Lessa.
- Pô, Excelência ! - manifestou-se o lobista.
Sandro, animado, quis logo os detalhes:
- E como a gente vai fazer?
- É aí que eu entro - disse o lobista - Eu conheço um mago que "sexangeia"
como ninguém...
- "Sexangeia "?
- Pô, Excê! Um cara que vive de desvendar o sexo dos anjos... Vai cobrar uma fortuna!
- Mas peraí - replicou Sandro - Se ele vive de desvendar, então já descobriu, não é preciso pesquisa...
- Pô, doutor, não é bem assim...
- Ué? Mas se ele vive de desvendar, como já não sabe?
- Pô, Excê! Ele vive de desvendar, mas não quer dizer que ele saiba...
- Ué? Como é isso, então? Se vive de desvendar e nunca desvendou, então passa fome, já que nunca desvendou?
- Não disse que nunca desvendou, Excê.
- Ele então já sabe qual é o sexo.
- Também não disse isso, doutor.
- Ora, seu Lontra, então me explica essa história de uma vez por todas!
- Pois é, doutor, não tem explicação...
- Ora, seu Lontra, mas como assim?!
- Não sei assim como, Excelência, mas é assim que vai ser.
- Ué?!
- Pô, Lessa, acorda! - interveio Jonas - É assim que vai ser pro povo! É pra não entender nada mesmo! As pessoas não vão entender nada, mas vão se interessar pra caramba!
- Aaaah!
- Entendeu, doutor?
- Agora, sim!
- Pois é, doutor. Quanto menos nosso mago definir as coisas, mais dinheiro será necessário pra pesquisa. E nada se descobre, e haja pedido de verba pública pra continuar a pesquisa!
- E quem vai aprovar?
- Nós, os parlamentares, Lessa!
- E os "home" lá vão estar de acordo?
- Bicho! - contou o lobista - Já falei com eles: tem um bocado de gente entre eles que já tá escolhendo os iates pras suas amantes.
- Ah, bom!
- Vamos lá, Lessa! - Jonas bateu no ombro do outro parlamentar. - Vamos arregaçar as mangas e pôr mãos à obra. É hora de faturar, meu nego! Faturar, meu filho! Faturaaaar!
Os três trocaram abraços, sorrisos e elogios, e Armando Lontra ainda disse em tom solene e emocionado:
- Não podemos perder a oportunidade de ser inseridos neste momento histórico. São homens como nós que constroem os destinos da nação.


2010

quarta-feira, 14 de abril de 2010

A CRIMINALIDADE E A DISCURSEIRA

A gente sabe perfeitamente o quanto é complexa essa questão do crime organizado, do tráfico de drogas no Rio, em São Paulo e em outros Estados do Brasil. Defender que a educação é a melhor medida é extremamente válido e positivo, além de muito, muito acertado. Mas tal remédio é preventivo, enquanto, porém, é preciso alguma ação efetiva contra a criminalidade que já está presente, formada, alojada, instalada, alicerçada, cristalizada, ou você acha que algum chefão do tráfico esteja disposto a freqüentar a escola para começar uma vida de homem de bem?
No plano em que discuto, fala-se ostensivamente em combate ao crime, tererê e pão duro, mas ostensivo, na verdade, é o discurso, a falácia. Entra governador e sai governador, o crime fica a cada dia mais robusto, mais vigoroso, mais pétreo. Vira e mexe, o governo federal manda umas tropinhas pra cá, a bandidagem, como boa anfitriã que é, aquieta-se um tempinho para deixar as tais tropas à vontade, e as forças armadas, agradecidas e lisonjeadas, logo, logo lá se vão de volta aos seus quartéis, cercadas de paz e naquela preguicinha boa de quem nunca precisa guerrear.
Vez por outra aventa-se a possibilidade de as drogas serem legalizadas e, com o fim do tráfico, as quadrilhas se desmontarem. Interessante opção, se as forças policiais estivessem equipadas e preparadas para o combate a esses indivíduos, que, "desempregados", dedicar-se-iam com maior afinco e freqüência a outras modalidades de crimes: assaltos à mão armada, seqüestros, comércio da morte e outras do gênero. Aí, para caírem os índices de criminalidade, seria preciso legalizar o tráfico de crianças, de órgãos, de animais, de mulheres, o comércio da morte, o assalto, o roubo, etc, etc... e aí, sim! Todos estaríamos felizes, porque, legalizadas as citadas "atividades", nada mais seria crime, e bandidos - então convertidos por força da nova legislação a cidadãos de bem - e autoridades seriam felizes para sempre.
Não é bem assim que a banda toca (ou ao menos não deveria tocar). A legalização das drogas não seria nociva se as autoridades estivessem preparadas e dispostas a dar efetivo e maciço combate ao crime, o que requereria investimentos, gastos, empenho, vontade política, seriedade, não discursinhos de palanque ou falácias em programas e jornais de tevê. Uma sociedade bem protegida não tem motivos para se preocupar com a legalidade ou ilegalidade das drogas. Não uso drogas e não me detive ainda a formar opinião sobre se a droga deva ser legal ou ilegal: penso que a discussão a tal respeito é algo mais de caráter ideológico do que político, sobretudo porque vejo o desejo de legalização como uma confissão de impotência ou indolência do poder público.
Acho, sim, que deveria haver harmonia e coesão entre as forças políticas no sentido de, através de educação e repressão, ser dado um efetivo e verdadeiro combate ao crime, seja ele crime organizado ou abagunçado. Não dá para combater o crime com estilingues e armas enferrujadas, com homens despreparados e pouco versados. Assim, eu defenderia o maior investimento, além de na educação, nas polícias, tanto as civis como militares e federais, como também - e por que não? E repito: por que não? - a participação das forças armadas. As forças armadas, sim. Por que não? - volto a repetir a pergunta.
As forças armadas estão fora da nossa realidade. Em tempo de paz, dão-se ao luxo de não prestar qualquer serviço à sociedade. Não é um desperdício e tanto de dinheiro público e armamento? Logo enquanto o crime organizado samba, dança, canta, faz firula e rebola diante da sociedade? Não venham os políticos de Brasília com a argumentação de que os militares são de elite e sei lá que mais, que não ficaria bem eles subindo favelas e trocando tiros com bandidos, nem que os mesmos estão despreparados para tanto e outras coisas do gênero, porque nada disso é crível. Se não estão preparados, pois que sejam. Sobretudo porque as forças armadas sempre foram de uma competência ímpar para combater movimentos estudantis, trabalhadores e cidadãos em manifestações, além de haverem-se especializado (e sem nenhuma demora ou rodeio) em dar combate às guerrilhas que lutaram contra o regime autoritário instaurado no Brasil a partir de 1964 e que só saiu de cena vinte anos depois. Encontraram e executaram Carlos Lamarca no fundo do sertão da Bahia, onde nem Deus o encontraria; aniquilaram os guerrilheiros do Araguaia num histórico e violentíssimo massacre, desbarataram a Vanguada Popular Revolucionária e ganharam inúmeras outras medalhas de bravura por atos semelhantes. Dito isto, responda-me: o que as forças armadas de ontem têm que as de hoje não podem ter?
Enfim, se o Brasil não está enfrentando ou em vias de enfrentar alguma guerra, ora, amigo! Papel de forças armadas é combater a criminalidade!
2010

domingo, 4 de abril de 2010

FABULAZINHA DE DEUS ABANDONADO

Era um dia como outro qualquer, até que subitamente ouviram-se trombetas que encheram o céu e a terra, e a voz do arcanjo Gabriel anunciou:
-- Filhos do Senhor, parai todos e ouvi atentamente o que o nosso Deus tem a vos falar!
O mundo inteiro parou e silenciou. A voz do Senhor, bonita, grave, sonora, cheia de eco de uma acústica celestial, principiou:
-- Filhos... tenho uma péssima notícia para vos dar.
O mundo, ainda quedado, agora se via aflito e lotado de curiosidade:
-- Tendes visto que tudo tem piorado? As catástrofes naturais têm sido mais frequentes. A ambição, mais do que nunca, tem gerado e alimentado  guerras. Os homens vêm agindo com o desamor e crueldade da era pré-cristã, como se tudo o que o Messias pregou não fosse para ser levado a sério. O crime a cada dia ganha mais corpo e força, pouco hoje se escondendo, tamanho o seu poder. Os maus políticos, já existentes na Antiguidade, permanecem invulneráveis, impunes, crescentes em número, existindo hoje numa maioria superior à da Antiga Roma.
"Não percebeis, filhos, o que está acontecendo?"
As pessoas permaneciam caladas, Deus prosseguiu :
--A Natureza vem sendo esmagada pelos homens, as espécies animais estão em processo de extinção mais acelerado. Tudo o que é ruim está crescendo em número e tamanho e tomando conta do mundo. O "Big Brother Brasil" vingou e é sempre campeão de audiência, os seus congêneres também arrebanham um tremendo público! Os programas de auditório têm a cada dia mais ibope. Todos os aparelhos de som tocam "funk" e pagode. Não percebeis o que ocorre? Não percebeis?
Os habitantes da Terra permaneciam silentes, todos ainda aparvalhados de perplexidade.
-- Pois eu vos digo, meus filhos. Preparai-vos para ouvir.
Seguiu o silêncio, Deus vociferou:
-- Perdi a guerra contra Satanás.
Um "oh!" geral, mundial e desolado. O Senhor continuou:
-- Mais do que isto, meus filhos... - uma grande pausa para rufarem os tambores, o Pai Eterno tornou: - Perdi o poder.
Nunca se viu um "oh" tão desesperado, desolado, desesperado, tão geral e tão sonoro. Desmaios, gritos, ataques histéricos, internações, uma tempestade moral no mundo.
-- Se quiserdes permanecer comigo - seguiu Deus - estarei sempre convosco. Mas ficai sabendo que agora nada mais posso, já que, infelizmente, só o Diabo tem poder.
Despediu-se (até porque Deus é objetivo, não fica falando à toa):
-- Até o momento em que algum de vós me quereis falar.  Sede felizes.
Alguns dias após o imensurável, mundial e descomunal choque, as pessoas começaram a comentar:
-- E agora?  O que será de nós?
-- Pois é...
-- Veja só! Deus sem poder, onde se viu?
-- Uma desgraça! Agora o poder está nas mãos do outro.
-- Outro?
-- É, o outro!
-- Outro?
-- É. Aquele cujo nome não se deve falar.
-- Ah, é...!!
-- O outro...
-- O outro...
-- Cujo nome não se pode falar...
--... não se pode falar...
-- Ora! Mas por que não??
-- É! Por que não?
-- Ora essa!
-- É! Ora essa!
-- Pensando bem, o outro sempre foi bem mais simpático... Deus sempre fechadão, lá na dele, muito sério, achando tudo imoral e errado...
-- É. O outro sempre foi alegre, galhofeiro, gozador..
-- Também sempre achei!
-- Nunca proibiu a gente de nada. A gente sempre pôde sambar, se despir, cornear, beber, matar, farrear, colocar o pé na frente do garçom...
-- Pois é! Muito mais liberal, muito mais sem frescura. Sempre deu à gente inteira liberdade.
-- Apoiado! Acho que agora a gente vai ser muito mais feliz com o outro. E eu falo o nome dele, sim! Satanás, pronto!
-- Também falo: Satanás!
-- Isso! Louvado seja Satnás!
-- Onde se viu? A gente vivia numa repressão danada, agora vai ter liberdade e felicidade.
-- Um Deus sem poder... De que adianta? Ora essa!
-- É... Um Deus  sem poder... Onde se viu?
E assim as pessoas, adesistas, interesseiras, ingratas, prostitutas que são, passaram a devotar-se e  a preces ao diabo.
Moral: quem não tem poder ou vantagem a oferecer, vive sem amigos e ignorado por  todos.


domingo, 21 de março de 2010

ASSUNTO POLÊMICO

"Excelentíssimos senhores parlamentares desta Casa Legislativa, hoje venho tratar de um assunto que as pessoas em geral evitam, não sei se por questões morais ou por negligência e comodismo, mas que nós, legisladores, não podemos, doa a quem doer, aconteça o que acontecer, nos furtar a debater nesta sessão de hoje. É um assunto controverso, obscuro, mas que tem de ser tratado com coragem e determinação por este plenário. Vamos tratá-lo sem ceder a pressões de quem quer que seja, porque esta entidade é independente e soberana para colocar em pauta o que bem entender."
"O assunto de que falo, nobres colegas de tantas lutas e batalhas, é o sexo dos anjos."
"Sim, o sexo dos anjos, sim, senhores - um braço erguido com um dedo apontado para o teto, a voz inflamada - O sexo dos anjos, sim, nobres colegas! Repito que este país não pode fugir a colocá-lo em discussão, para defini-lo de uma vez por todas, com o peito aberto e a fibra que nos é peculiar!"
Aplausos da platéia.
"Esta casa discute aborto, discute  maioridade penal, discute relação de trabalho, e agora, senhores, como se acharia no direito de evitar discutir o sexo dos nossos sublimes anjos, esses abnegados e celestiais emissários do Senhor?!"
Mais aplausos, parlamentares chorando, parlamentares abrindo os braços voltados para o céu, aleluia!
"Meus senhores, este será um momento histórico, toda a posteridade registrará a nossa bravura, intrepidez, esta ocasião nesta casa que tanto honramos e da qual fazemos o manancial de toda a justiça, toda a disciplina, toda a inteireza e todo o bom senso e moral deste maravilhoso país!"
Aplausos pra cacete! Apupos histéricos daquela plateia formada de parlamentares enfiados em ternos requintados e enforcados em gravatas de primeira linha.
"Vamos, meus nobres amigos! Vamos, meu nobre país, discutir o assunto que é da maior relevância para o futuro e o destino desta idolatrada, e grandiosa, e magnífica nação!"
E assim seguiu a sessão, tratando do assunto tão elevado e relevante. Você acha menos inúteis e estapafúrdias algumas coisas que são discutidas pelos parlamentares deste país?

2010

sábado, 20 de março de 2010

A VERDADEIRA FACE DO PODER


Nos tempos mais remotos da história da humanidade, hordas de aventureiros invadiam territórios e subjugavam outros povos, promovendo carnificinas e uma série de outras crueldades. Alguns invasores, porém, fixavam-se nos territórios dominados e impunham-lhes rudimentos de regras severos e geralmente injustos, porque tais normas ( se assim podiam ser chamadas ) não visavam a distribuir justiça, ética, promover desenvolvimento ou fazer valer a moralidade, mas unicamente a conservar para os invasores o poder e as benesses do poder.
Hoje, passados mais de quarenta séculos da inauguração de tal praxe, o poder, sobretudo nos países de terceiro mundo, tem os mesmos vícios, os mesmos cacoetes, sem outro intuito além da manutenção dos privilégios nas mãos dos que o compõem ou a ele estão ligados. Em outras palavras, o Estado, que é parte integrante do poder que nos governa -- uma vez que boa parcela dos poderosos em qualquer país não ocupa cargo público -- não tem nenhum interesse em promover o bem-estar social. E por esse mesmo motivo precisaria ser perpétua e rigorosamente vigiado e policiado pelos que vivem em sua jurisdição e sob os seus preceitos. O Estado, complô das elites e meio de exercício de mando das classes dominantes, precisa ser constantemente pressionado e fiscalizado para que a sociedade possa avançar, para que o cidadão possa obter dele o mais que devido respeito e a real condição daquilo de que é chamado (cidadão). Entretanto, realizar tal empresa é algo extremamente difícil, quase impossível.
Seria preciso, antes de tudo, embasamento por parte do povo quanto às questões sociais e políticas, além do conhecimento do verdadeiro perfil do poder, o que já é dificultado pelas poucas chances de acesso à educação e à cultura que os governos oferecem -- do mesmo modo como Esparta implementava o laconismo como meio de dar poucos e parcos conhecimentos ao seu povo mais de vinte séculos atrás -- e pelo papel que a mídia exerce nos dias de hoje, sendo aliada dos governantes no trabalho de desinformar e enganar, confundindo a opinião pública e fabricando "verdades" e "mentiras" que sempre se afinam perfeitamente aos interesses dos poderosos. Ora, a mídia, composta por gente que troca favores com o poder, que vive à sombra deste( do qual faz parte), que outra postura poderia ter nesse contexto? É ela tão provida de recursos e argumentos, que hoje quase ou nunca o poder precisa recorrer à força para defender os interesses das castas que tem a função de privilegiar e proteger.
Só as sociedades mais avançadas conseguem fazer que o Estado exerça o papel que lhe cabe, porque tiveram acesso ao conhecimento de causa que não é dado aos povos de terceiro mundo, além de terem histórias muito diversas das vivenciadas pelas sociedades menos afortunadas -- em sua maioria havendo arrancado do poder tudo aquilo que este não lhes queria propiciar, nem sempre por meios exatamente pacíficos, e ainda assim alguns séculos atrás, quando os veículos de comunicação eram precários e não tinham a força  de  quarto poder (como até já foi intitulado um filme americano), o que favoreceu, entre outras coisas, o crescimento das ideias iluministas e o crescimento da não-aceitação aos desmandos dos poderosos.
Em suma, o poder não é justo ou ético, o poder é apenas o poder, sequioso das benesses que recebe de si próprio (com os recursos dos governados) e cioso em não se deixar mover de sua confortável posição. Dele nada é recebido, mas conquistado com reivindicação e luta alicerçada no imprescindível conhecimento a que aqui faço alusão. Todavia, e infelizmente, não vislumbro, para os países de terceiro mundo, muitas chances de se alcançar este conhecimento de causa que leva à luta e à conquista.

domingo, 28 de fevereiro de 2010

A RESSACA E OS EVENTOS ESPORTIVOS

Hoje acordei de ressaca, com um martelo querendo sair por minha caixa craniana a fora. Tentei mandar alguma coisa nova como mensagem, mas nada saiu da minha idéia: acho que é o tal martelo que está atingindo a zona do cérebro responsável pela criatividade (deve tê-la tornado ressecada e árida). Não quis enviar um texto antigo, deixei o computador. Resolvi então, frustrado, me postar diante da televisão, e isto acabou por me dar um certo alento: os caras só falam em Copa de 2014, Olimpíadas de 2016... Olimpíadas de 2016 no Rio...Copa de 2014 no Brasil. Eu os entendo: eles também tão em crise de criatividade. Também beberam muito ontem à noite.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

O HORÁRIO DE VERÃO

Senti um grande alívio hoje de manhã, em razão do final do horário de verão. Foi com um prazer sem tamanho que fui a todos os relógios da casa e os atualizei. Mas fiquei depois a analisar (como faço sempre quando estou sob aquele horário maluco) sobre a necessidade ou não de adiantar os relógios durante a estação. O objetivo dos governos tem sido realmente economizar energia? A energia economizada é significativa? É realmente necessário sacrificar o nosso relógio biológico por uma parca economia de energia? Ou o pano de fundo disso seria a disposição permanente dos nossos governantes em agradar aos tubarões da rede hoteleira, que faturam uma fábula por terem os seus estabelecimentos numa região onde o sol vai até as vinte e uma horas ( o que atrai um sem-número de turistas)? Sabe como é: o governo, como aliás todo governo, tem uma sensibilidade à flor da pele, um verdadeiro coração de mãe, de manteiga mesmo, quando se trata de atender aos anseios das classes abastadas, que mantêm, como todos sabem, um lobby poderosíssimo dentro do poder público. E, assim, nós ficamos esgotados enquanto os donos da indústria hoteleira ganham rios de dinheiro. Bonito isso, não?
Não me resta, então, nada senão arremedar o anarquista espanhol: Hay gobierno? Soy contra!